Nos dias 15 e 16 de setembro ocorreu o II encontro de tradutores de francês, organizado pelo Prof. Dr. Álvaro Faleiros, da USP. O primeiro, em 2006, foi em Brasília. De lá para cá houve alguma perda no número de participantes e no conforto do espaço: apesar do charme, a Casa das Rosas não oferece a larga comodidade da UnB e da Embaixada da França, cenários do primeiro encontro. Há, porém, a certeza de que esses inconvenientes não são de responsabilidade do Prof. Álvaro Faleiros, e sim da já famosa estreiteza (em todos os sentidos) das verbas disponíveis.
Em compensação, houve momentos excelentes. Não pude assistir a todas as apresentações, devo ter perdido muita coisa boa. Do que vi, cito aqui o que ficou marcado na memória:
A Conferência de abertura apresentada por Gérard Dessons, Henri Meschonnic et la poétique du traduire, tratou de um assunto complexo que acompanhei porque cuidei desse autor no meu doutorado. Isso me leva a perguntar até que ponto a exposição foi aproveitada por quem não conhecia o assunto.
Da mesa Tradução, história e sociedade, me pareceram dignas de nota as apresentações Le Brésil traduit la France ou l’autre représenté, de Marie-Hélène Catherine Torres (UFSC), estudiosa que sempre impressiona pela energia,Tradução, trocas literárias e estratégias editoriais, de Marta Pragana Dantas (UFPB), interessante apanhado dos números da literatura francesa no mercado editorial brasileiro, e A tradução de textos criativos: os exercícios de estilo de Raymond Queneau e Luiz Rezende, de Márcia Maria Valle Arbex (UFMG). Foi muito proveitosa a discussão surgida destas três últimas apresentações.
Na mesa Traduzir prosas do mundo, despertou interesse especial a apresentação de Germana H. Pereira de Souza sobre as traduções de Les liaisons dangereuses de Laclos. Eu já tinha assistido às primeiras elucubrações de Germana sobre o assunto em 2000, num encontro da ABRALIC em Belo Horizonte. Na época, já me pareceu que a pedra no sapato dessa e de outras traduções francesas é assunto que mereceria um estudo sociológico: como traduzir em português do Brasil as sutis representações sociais contidas nos pronomes vous e tu? Achei que o estudo de Germana deu um belo passo de 2000 até agora, mas ainda haveria outros, mais audazes, de que ela sem dúvida é capaz. Ficaremos à espera, portanto.
Muito interessante também me pareceu o trabalho sobre tradução de utopias no Renascimento, feito pela doutoranda da UNICAMP, Ana Cláudia Romano Ribeiro.
A mesa em que se inseriu minha comunicação foi mallarmeano-baudelairiana, com interessantes participações de Marcos Siscar (da UNESP) e Júlio Castañon Guimarães (da Fundação Casa de Rui Barbosa). Mallarmé ficou por conta destes. De Baudelaire encarregou-se o Ricardo Meirelles, que conheço como tradutor de poesias há uma década pelo menos; agora está fazendo doutorado na USP. Espero assistir à sua defesa. Como contraponto, falei de Idade Média e li minhas traduções.
O dia para mim terminou com a instigante apresentação de Inês Oseki-Depré sobre sua tradução de Jacques Roubaud. Conheci então o poeta e reencontrei a antiga e querida professora de latim que não via há muitos anos. A emoção contribuiu para o cansaço, saí antes da última apresentação.
O dia 16 para mim terminou depois da segunda mesa. Eu precisava voltar para a roça, nome dado pela Sônia Goldfeder ao meu lar, doce lar. Mas a manhã valeu por duas apresentações. A primeira foi sobre o Centre International de Traduction Littéraire, que oferece bolsas a tradutores, e sobre o Bureau du livre.
A segunda foi uma mesa-redonda com três editoras: WMF Martins Fontes, Cosac Naify e Estação Liberdade. Trata-se de um evento memorável. Pela primeira vez em toda a história dos encontros, colóquios e congressos de tradutores que conheci por testemunhar ou ouvir falar, houve o comparecimento editoras. E não só: três editoras representativas, honestas e respeitáveis. Seus três representantes fizeram primeiramente comentários sobre seus catálogos. Depois foi discutida a relação tradutor-editora, em que se ressaltou a importância de um bom setor editorial, formado por pessoas realmente competentes, para o contato e a troca de ideias e informações com o tradutor. Também foi oportunamente lembrada a importância do destaque do nome do tradutor nos releases para a imprensa, como contribuição das editoras na minimização dos problemas de plágio, pelos quais elas são também afetadas. Lembramos a atuação da colega Denise Bottmann quando do escândalo dos plágios e também foi mencionado que a ela devemos o fato de hoje jornais como o Estado de São Paulo acrescentarem o nome do tradutor (seu blogue: Não gosto de plágio). Para finalizar a reunião, o Prof. Álvaro Faleiros lembrou oportunamente a necessidade de um bom dicionário de francês-português. E cobrou.
Não assisti à reunião da tarde sobre tradução de psicanálise. Imagino que foi boa, mas sei que teria sido muito melhor se dela tivesse participado alguém que está na linha de frente das discussões sobre o assunto: a tradutora e psicanalista Claudia Berliner. Difícil no Brasil falar de tradução de Lacan sem a presença de alguém que se dedica a tais questões com profundidade e competência há tantos anos. Fica a sugestão para a próxima.
Também não assisti às comunicações dedicadas à tradução juramentada, área na qual não atuo.
Foi um bom encontro, afinal. Principalmente porque nele o persistente e costumeiro reinado da Academia foi enriquecido e colorido pela presença dos setores práticos da atividade, por discussões sobre mercado editorial e relação editora-tradutor.
Destaco no fim, para ficar na lembrança, dois nomes fundamentais ao bom andamento do encontro: a Profa. Adriana Zavaglia e Marion Celli, monitora do Ciclo do Livro.
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